sábado, 8 de novembro de 2025

CIMEIRA DAS CIDADES IRMÃS

 

CIMEIRA DAS CIDADES IRMÃS EM PONTA DELGADA, AÇORES: FORTALECENDO LAÇOS TRANSATLÂNTICOS

Ao Sabor do Vento



 

Cimeira das Cidades Irmãs (Sister Cities Summit), realizada em Ponta Delgada, na ilha de São Miguel, Açores, entre 25 e 27 de junho de 2025, representou um evento de relevância internacional. Este encontro reuniu representantes de cidades e municípios geminados de Portugal

e dos Estados Unidos da América, com a principal finalidade de celebrar e reforçar a relação bilateral entre os dois países, destacando os laços históricos e a importância da cooperação transatlântica. O evento visou, em particular, reconhecer e valorizar a profundidade dessas relações.

A organização da Cimeira foi uma iniciativa conjunta da Fundação Luso-Americana para o Desenvolvimento (FLAD) e do Governo dos Açores. A sua realização integrou as celebrações do 40.º aniversário da FLAD, conferindo ao evento um estatuto elevado. O patrocínio do Presidente da República Portuguesa, Marcelo Rebelo de Sousa, sublinhou a prioridade estratégica nacional de Portugal em solidificar a sua relação com os Estados Unidos através de uma diplomacia de base, que se estende aos níveis locais. Esta abordagem demonstrou uma intenção deliberada de infundir o evento com maior peso político e diplomático, utilizando o conceito de “Cidades Irmãs” como uma alavanca estratégica para fortalecer os laços bilaterais mais amplos, especialmente considerando as preocupações relacionadas com a nova administração norte-americana. Ponta Delgada, com o Teatro Micaelense como um dos locais centrais, foi a cidade anfitriã.

 

A FLAD, criada em 20 de maio de 1985, como resultado direto do Acordo de Cooperação e Defesa de 1983 entre Portugal e os Estados Unidos, tem desempenhado um papel fundamental no fomento das relações entre os dois países. Este acordo abrange disposições de apoio militar, económico e energético, com destaque para a contínua presença dos EUA na Base Aérea das Lajes, nos Açores. A origem da FLAD, ligada a um acordo de defesa, revela que a iniciativa das “Cidades Irmãs”, embora pareça uma forma de diplomacia suave, está intrinsecamente enraizada e serve interesses geopolíticos estratégicos, cultivando laços culturais e económicos para apoiar parcerias mais amplas de segurança e defesa. O Consulado dos EUA em Ponta Delgada, reconhecido como o “consulado mais antigo do mundo com funcionamento ininterrupto”, celebrou 230 anos de relações, sublinhando os laços profundos e de longa data entre os Açores e os Estados Unidos. A cimeira incluiu um momento de homenagem a este aniversário, acentuando a sua importância histórica e estratégica.

 

A imigração portuguesa também desempenha um papel crucial. Existem atualmente cerca de 60 acordos de geminação entre cidades portuguesas (incluindo as dos Açores) e cidades dos EUA, com aproximadamente 40 cidades norte-americanas envolvidas, cujas localizações frequentemente refletem o movimento histórico de imigrantes portugueses. Cidades dos EUA com uma significativa herança luso-americana, como Fall River, New Bedford, Newark, Providence, Sausalito e San José, foram convidadas a enviar delegações. Mais de 1,3 milhões de indivíduos de ascendência portuguesa, a maioria com raízes nos Açores, residem nos Estados Unidos, formando um “elo vital que une ambos os países, promovendo a compreensãomútuaeacooperação”.Esta“diplomacia cidadã” cria uma rede robusta, de baixo para cima, que pode sustentar as relações mesmo quando as dinâmicas políticas de cima para baixo enfrentam desafios.

 

O objetivo primordial da Cimeira foi promover a cooperação transatlântica, procurando “criar e fortalecer redes entre diferentes cidades em diversas dimensões (cultura, sociedade, economia, educação e ciência, entre outras)”, e reavivar acordos de geminação já existentes. A Cimeira teve como propósito impulsionar a colaboração económica, a diplomacia culturaleoenvolvimentojuvenil.Asáreasespecíficas

 

de discussão incluíram as melhores práticas em cooperação municipal internacional, intercâmbio cultural e desenvolvimento turístico, capacitação juvenil e educação cívica, e investimento. A localização estratégica dos Açores foi destacada como um fator de apoio a parcerias nas áreas da defesa e economia,fortalecendoasegurançaeaprosperidade de ambos os continentes. Foram realçadas oportunidades em exportações de produtos sustentáveis e de alta qualidade, cooperação científica no Atlântico, fontes de energia renovável e tecnologias marinhas. O Presidente do Governo dos Açores, José Manuel Bolieiro, salientou que “num mundo em constante mudança, onde a ordem global está a sofrer convulsões, o melhor e mais seguro caminho para o progresso e desenvolvimento dos povos é o diálogo e a cooperação entre as comunidades”. Ele expressou o desejo de “aprofundar estas relações” e “superar adistânciageográficaeanossapequenadimensão”, vendo“omareoespaço”comoo“nossocaminho rápido para o mundo, para a América, para o desenvolvimento”.

 

A Cimeira reuniu líderes governamentais locais e nacionais, incluindo o Presidente português Marcelo

Rebelo de Sousa, legisladores, organizadores cívicos e representantes juvenis de Portugal e dos Estados Unidos. Entre os participantes notáveis encontravam se Nuno Morais Sarmento (Presidente da FLAD), José Manuel Bolieiro (Presidente do Governo dos Açores), Francisco Duarte Lopes (Embaixador de Portugal nos EUA) e Douglas A. Koneff (Encarregado de Negócios da Embaixada dos EUA em Portugal). Mais de 30 cidades e municípios de ambos os lados do Atlântico estiveram representados. A cerimónia de encerramento contou com uma intervenção de José Manuel Durão Barroso, antigo Presidente da Comissão Europeia e Primeiro-Ministro de Portugal. As sessões contaram com introduções de figuras como Piedade Lalanda (Presidente do Conselho Económico e Social dos Açores), Gui Menezes (Diretor do OKEANOS – Instituto de Investigação em Ciências do Mar da Universidade dos Açores) e Diniz Borges (Diretor do Portuguese Beyond Borders Institute da Califórnia State University). Um “Concerto das Cidades Irmãs” com FADO alado e a Orquestra Ligeira de Ponta Delgada também fez parte do programa.

No intervalo das sessões houve sempre um beberete com vinhos, variadíssimos aperitivos e vários refrigerantes.

Além disso, deve-se realçar o jantar típico no Solar da Graça onde o grupo Folclórico da Fajã de Baixo cantou várias modas, o almoço no anfiteatro Portas do Mar, o cocktail oferecido pelo Presidente do Governo Regional dos Açores, José Manuel Bolieiro, no Palácio da Conceição, o passeio às Furnas e um belo Cozido à Portuguesa no Hotel Terra Nostra. Os Açores são descritos como possuindo uma “vocação natural como ponto de encontro e de intercâmbio de pessoas e culturas” devido à sua localização estratégica, o que tem historicamente apoiado “parcerias importantes nas áreas da defesa e da economia, reforçando asegurançaeaprosperidadedeambosos continentes”. A Cimeira das Cidades Irmãs em Ponta Delgada serviu como um poderoso lembrete da duradoura relação entre Portugal e os Estados Unidos, constituindo uma plataforma indispensável para o fortalecimento das relações entre cidades e vilas.

A maneira como as sessões ocorreram, a forma requintada como tudo foi programado e preparado, e a eloquência dos participantes nos seus discursos ou intervenções, provou, sem dúvida alguma, que os Açores são o fulcro da alavanca entre Portugal e os Estados Unidos da América.

UMA CONVERSA COM MARCO FERREIRA Chef do restaurante Escuna no Hotel Marina Atlântico

 

UMA CONVERSA COM MARCO FERREIRA Chef do restaurante Escuna no Hotel Marina Atlântico

Ao Sabor do Vento



 

 

Durante a minha estadia no Hotel Marina Atlântico, em São Miguel, por ocasião da cimeira das cidades irmãs, comi talvez o polvo mais macio que já provei. Era tão bom que resolvi conversar com o chef do restaurante.

Filosofia Culinária e Inspiração

Gostaria de saber qual é a sua filosofia culinária e o que o inspira nas criações do cardápio aqui no hotel.

Eu penso que a base da cozinha é olharmos para onde estamos, ver o que podemos encontrar e trazer para a mesa o máximo que a terra nos pode dar em termos de ingredientes. Quando cheguei aos Açores, foi um mundo novo para mim — os ingredientes, os cheiros e os sabores. É óbvio que o menu tem de ter uma grande influência do mar, mas também tem de incluir os ingredientes da terra onde o restaurante está. Tem de ter a força da terra que saiu do mar e formou estas ilhas.

O que eu tenho de fazer é combinar esses dois elementos. Depois, empregar as técnicas de cozinha — técnicas que aprendemos na escola e nos restaurantes onde trabalhamos. E depois vem a parte sentimental, que são todas as memórias desde a época em que eu ficava escorado na beira do lava-louça, a ver a minha avó depilar os tomates e retirar as sementes.

Hotel Marina Atlântico, Av. João Bosco Mota Amaral n.º1, 767, 9500-767 Ponta Delgada. www.bensaudehotels.com/hotelmarinaatlantico

Hotel Marina Atlântico, Av. João Bosco Mota Amaral n.º1, 767, 9500-767 Ponta Delgada. www.bensaudehotels.com/hotelmarinaatlantico

A minha avó começava a preparar o almoço às nove horas da manhã, e eu, das nove até ao meio-dia, ficava ali ao lado dela ou de joelhos num banquinho, porque não chegava à bancada. Quando cresci mais um pouco, passava o tempo ali ao lado. Ela não me deixava tocar no fogão, com medo que eu me queimasse. Comecei a cozinhar aos 11 anos, mas mesmo assim ela não me deixava tocar no fogão.

Pratos de Assinatura e Favoritos

Quais são os pratos da sua assinatura?

Tem algum prato favorito no menu?

Eu não tenho um prato favorito; no entanto, tenho pratos que gosto mais de cozinhar do que outros, como os estufados. Gosto de preparar pratos que levam tempo, como ossobuco ou barriga de porco, que precisa de ficar no forno durante horas, ou então costela de vaca, que tem de estar nas brasas de 12 a 13 horas. Isso é que me fascina — ver a transformação, como quando começamos um ragù para fazer uma lasanha. É impressionante: depois de 4, 5 ou 6 horas, ver o resultado final.

Chef MARCO FERREIRA

Chef MARCO FERREIRA

Fornecimento de Ingredientes

Como é que aborda o fornecimento dos ingredientes, especialmente considerando a escala do restaurante do hotel?

Aqui nas ilhas somos abençoados, porque fazemos parte de um grupo muito grande, com presença em várias áreas, o que nos dá segurança no fornecimento. A nível de abastecimento, raramente temos problemas.

Claro que depois temos os fornecedores independentes, cada um com a sua realidade, e aí, a parte dos ingredientes frescos ainda deixa a desejar em certas épocas — sobretudo no caso das frutas e dos peixes — principalmente quando a oferta de peixe fresco diminui. De resto, temos sempre abastecimento durante todo o ano.

Polvo À Lagareiro

Polvo À Lagareiro

Sobre o Polvo

Sobre o polvo de ontem, já disse que foi o mais macio que comi. Poderia compartilhar um pouco sobreoprocessoeatécnicaparachegaraesse ponto? Não quero que me diga os seus segredos…

Aquilo não tem segredo nenhum. É uma receita dos polvos da avozinha, uma delícia que fazem no povoado. A receita vem da Galiza. O polvo vai inteiro para a panela, exatamente como vem, congelado. Depois vai ao forno num tabuleiro e é temperado com azeite, alho, etc.

Desafios no Hotel

Quais são os desafios que tem encontrado aqui no hotel?

O hotel traz muitas vantagens, mas também tem uma particularidade: temos de pensar globalmente. Num restaurante independente, é possível criar uma identidade e o cliente procura-o justamente por essa oferta e conceito. Num hotel, não. No hotel, temos de fazer uma comida o mais variada possível, ir em busca dos ingredientes e das técnicas mais diversas para satisfazer o público que nos visita — o que não acontece da mesma forma nos restaurantes.

Restaurante Escuna

Restaurante Escuna

Atualização do Menu

Com que frequência atualiza o seu menu e que pratos novos inclui?

Aqui nos Açores, o menu provavelmente muda de forma radical uma vez por ano. No entanto, por vezes combinamos que, a partir de determinada data, fazemos pequenas alterações. Estamos sempre atentos ao que os clientes nos dizem, porque se um prato, por qualquer motivo, agrada menos, não faz sentido continuar a servi-lo.

Quanto à sua trajetória profissional, o que o torna um chef? Tem algum conselho para os

aspirantes a profissionais de culinária? Eu sempre gostei de cozinhar — acho que é algo com que se nasce. Se a pessoa não gosta, não vale a pena seguir esse caminho. Não há mistérios nem meiostermos: é 8 ou 80.

 

 

Quando se trabalha nas cozinhas de topo, ou vais ou deixas. Essas cozinhas ensinam o que é a verdadeira paixão: depois de muitas horas de trabalho, preparar um prato de leitão ou de novilho, com os pés já a queimar, e mesmo assim terminar com gosto, chegando a casa e dormindo descansado, com a consciência de que criaste algo importante e satisfatório. Fala-se muito da paixão pela cozinha, mas é preciso também muita persistência. Eu acho que a base é a persistência. Se persistires, a dada altura vais chegar lá.

Você nasceu em Porto Alegre, no Brasil. Eu moro a norte da Baía de São Francisco, onde há muitos brasileiros e portugueses. Gostaria de dizer algo para eles?

Eu já lá estive um mês, conheço bem aquela área. É muito bonita. Tive o privilégio de lá trabalhar num evento. A única coisa que tenho a dizer é: venham visitar-nos, venham cá ver-nos. Isto aqui é fantástico. Em especial para os açorianos que residem no estrangeiro, digo para não deixarem de vir cá. Os Açores continuam a mudar. Venham cá passar férias.

Foi um prazer falar consigo, Marco Ferreira. Desejo-lhe muitas felicidades e espero que não seja a última vez que nos encontramos.

LITTLE GOAN CAFE


Hidden in the Square Shopping center, in Novato, we found a golden gem of a restaurant. Little Goan Cafe. It is a very cozy place and as soon as one approaches it the fragrance of the Idian spices is inviting. Right after we entered a waiter by the name of Ludwig Ferrão, without a doubt, a Portuguese name, welcomed us and directed us to our table. He brought some Samosas for appetizers. They were delicious as well as the 3 sauces that accompanied them.
For the main course, I ordered Chicken cafreal, a dish of which I have heard so much but had never tried, my wife ordered Caldine chicken curry and my sister, Vindaloo shrimp.
 The chicken cafreal was amazing. At each bite I could taste the greatness of the exotic spices.  I took a bite from my wife’s Caldine chicken curry. It was delicious. My sister, since she is pescatarian and had opted for the shrimp was in for an unexpected experience.
In an Indian restaurant some people do not use silver ware. They eat by cutting little pieces of a flat bread called Naan and scoop the food from the plate with it.  Naan is normally made in a tandoor oven. I have had it before at other Indian restaurants, but the Naan at this place was by far much better. Although the silver ware was on the table I thought it would be more fun to scoop the food. I was not going to leave that delicious gravy in the plate. During our meal we had the chance to talk to the owners about a variety of dishes that they serve at their restaurant such as the shrimp or chicken Vindaloo.

Vindaloo is a colloquialism of the Portuguese recipe Vinha-de-alhos. 
We could not finish such an amazing meal without trying a Goan dessert and since my wife and I are diabetics we decided to have one dessert with 3 spoons. The Gulab Jamun-homemade fried cheese dumplings soaked in syrup was a very sweet treat. The menu is well chosen, with enough variety of appetizers, main dishes, desserts and beverages. The list of the Little Goan house breads has 16 different variations and some of them are gluten free. It was for us a pleasure to eat at Little Goan Indian Cafe located at 2007 Novato Blvd. in Novato, California.
Before we left I asked if I could speak to the owner and in a few minutes the chef/ owner and his wife came to talk with us.

He said his name was Eulogio (Lino) Pereira and his wife Sharon were 4th generation Portuguese and that was the reason for them to have the Portuguese flag in the restaurant as well as the shirt from the Futebol Clube of Goa.
Dining in the presence of the Portuguese flag at a restaurant owned by people with Portuguese names, and from Goa, although thousand of miles away from their homeland as we are, it made us feel as if we were among family. You will have a nice experience when visiting Little Goan Cafe.

sexta-feira, 7 de novembro de 2025

 OS MEUS COZINHADOS

                                                       Galinha com arroz um ovo e figos  





Choquinhos com arroz 

                                                                       Lula recheada 


                                               Bacalhau flambé com cebola, pimentos e alho  

                                       







 

SE O CAMINHO DA TERRA À LUA…

Ao Sabor do Vento



 

Durante séculos, a lua tem sido uma testemunha silenciosa dos sonhos da humanidade, um farol distante que alimenta a nossa imaginação. Falamos de foguetões e viagens espaciais, do vazio ilimitado para lá do abraço da Terra. No entanto, para mim, a jornada às estrelas começou muito antes do Cabo Canaveral. Começou com o sussurro dos ventos em velas de lona, o ranger de tábuas de

madeiraeacoragemilimitadadaquelesque ousaram navegar o desconhecido. Como um português dos Açores, sempre senti que “Se o caminho da terra à Lua fosse mar o primeiro foguetão teria sido uma caravela Portuguesa”. Esta declaração profunda não é apenas uma fantasia; ela encapsula a própria essência da Era Portuguesa da Descoberta, um espírito que continua a ressoar hoje.

Imagine, por um momento, uma caravela portuguesa, não a navegar as águas azuis do Atlântico, mas a traçar um curso pela escuridão do espaço. As suas velas latinas, perfeitamente projetadas para orçar contra o vento, agora apanham ventos solares, impulsionando a em direção a um horizonte lunar. Esta imagem fantasiosa, nascida de uma profunda compreensão da história e de um espírito irreprimível, liga perfeitamente a distância entre as glórias do passado e as ambições futuras. Ela lembra-nos que a motivação humana fundamental para explorar, para ir além do horizonte, permanece inalterada, quer o destino seja um continente inexplorado ou um distante corpo celeste.

se o caminho da terra à Lua fosse mar, o primeiro foguetão teria sido uma caravela Portuguesa.

Se o caminho da terra à Lua fosse mar, o primeiro foguetão teria sido uma caravela Portuguesa.

A expansão marítima portuguesa, iniciada no início do século XV, foi nada menos que revolucionária. Não se tratava apenas de encontrar

novas rotas comerciais; foi um empreendimento audacioso impulsionado por uma potente mistura de curiosidade científica, necessidade económica e um desejo insaciável de saber o que existia para lá do familiar. Sob a liderança visionária de figuras como o Infante D. Henrique, Portugal desenvolveu sistematicamente o conhecimento, a tecnologia e as técnicas de navegação que iriam transformar o mundo. Reuniram cartógrafos, astrónomos e construtores de navios, unindo a experiência para criar embarcações e métodos capazes de suportar os perigosos e desconhecidos

oceanos.

A própria caravela era uma obra-prima da engenharia naval. Menor e mais ágil que os navios europeus anteriores, com as suas distintas velas latinas, ela podia navegar mais perto do vento, permitindo que os exploradores navegassem contra correntes e ventos predominantes que antes prendiam os marinheiros em águas costeiras. Esta inovação foi tão crucial para a sua época quanto o motor de foguetão é para a nossa. Foi o veículo que transportou homens como Bartolomeu Dias, que primeiro contornou o extremo sul de África em 1488, provando que uma rota marítima

para o Oriente era possível. Transportou Vasco da Gama, que, uma década depois, chegou com sucesso à Índia, abrindo uma ligação comercial marítima direta queremodelouocomércioeapolíticaglobal.

Mas as descobertas portuguesas foram mais do que apenas navios e rotas. Foram sobre a coragem de indivíduos que embarcaram em jornadas sem a certeza de regresso. Enfrentaram tempestades, doenças, encontros hostiseotormentopsicológicododesconhecido. Navegaram durante meses, vendo apenas a expansão infinita de água e céu, guiados por instrumentos

rudimentares e uma crença inabalável na sua missão. As suas jornadas foram repletas de perigos, no entanto, eles continuaram, impulsionados por um imperativo nacional e uma determinação pessoal que beira o heroísmo.

O impacto destas descobertas foi profundo e multifacetado. Globalmente, elas iniciaram a primeira era da globalização, ligando continentes e culturas que antes existiam em isolamento. Levaram a uma troca sem precedentes de bens, ideias, tecnologias e, infelizmente, de doenças e conflitos, alterando para sempre a paisagem demográfica e cultural do planeta.

Para Portugal, trouxeram imensa riqueza, transformando um pequeno reino periférico numa potência marítima dominante. Mas talvez mais duradouro do que o ouro e as especiarias foi o legado de exploração enraizado profundamente na psique nacional. É este legado que dá à minha citação o seu poder. Ela fala de uma herança onde o impossível era apenas o inexplorado. Sugere que o mesmo espírito audacioso que impulsionou caravelas através de vastos e aterradores oceanos está intrinsecamente ligado à ambição de alcançar a lua. Os desafios podem ser diferentes – o vácuo do espaço em vez de correntes traiçoeiras, propulsão avançada em vez de velas latinas – mas a característica humana fundamental permanece: o desejo de aventurar se, de descobrir, de ultrapassar os limites do que é conhecido e alcançável.

Num mundo que muitas vezes parece cada vez mais pequeno e interligado, a ideia da “caravela rumo à lua” serve como uma poderosa lembrança. Ela diz-nos que o espírito de aventura não está confinado a livros de história ou ficção científica. Ele vive dentro de nós, um eco genético daqueles que ousaram navegar para lá do limite do mapa. Encoraja-nos a olhar para novas fronteiras, sejam elas científicas, artísticas

ou pessoais, com a mesma curiosidade destemida que uma vez lançou uma frota de navios de madeira num oceano desconhecido, mudando para sempre o curso da história humana. Ela lembra-nos que o verdadeiro progresso muitas vezes começa com um sonho, uma visão tão grandiosa e improvável como uma caravela a navegar para a lua.

Não tenho dúvida alguma e, repito, que se o caminho da terra à Lua fosse mar, o primeiro foguetão teria sido uma caravela Portuguesa.

 

O REGRESSO DE E O MONOPÓLIO DO PPM NO ATLÂNTICO

Ao Sabor do Vento



 

 

Amitologia portuguesa, embora não possua um panteão formal de deuses como as culturas clássicas, é incrivelmente rica em lendas, folclore e crenças populares que formam o nosso imaginário nacional. Podemos organizar estes elementos começando pelos mitos mais estruturantes, passando pelas crenças folclóricas mais disseminadas e terminando nas figuras ligadas ao nosso maior desafio: o mar.

Os Mitos Fundamentais e Estruturantes

Dois mitos funcionam como pilares do nosso imaginário, ligando o povo à terra e à História:

As Mouras Encantadas: Este é o mito mais abrangente, presente em quase todas as regiões. As Mouras são belas jovens que habitam sob dólmenes, em grutas ou junto a fontes, guardando tesouros e à espera de serem desencantadas. Elas ligam a cultura portuguesa a antigas crenças da terra e da água, fundindo-se com o imaginário das fadas e a herança da presença árabe.

 

 

O Sebastianismo: Este é um mito de natureza política e messiânica, nascido da dor e da perda da independência após a Batalha de Alcácer-Quibir (1578). É a crença profundamente enraizada de que o Rei D. Sebastião não morreu, mas regressará “numa manhã de névoa” para salvar Portugal da decadência e restaurar a sua antiga glória. Funcionou como um motor de esperança e resistência.

Crenças Populares e Seres do Folclore

O nosso folclore está repleto de criaturas e figuras que explicam medos ou promovem a moral popular:

O Lobisomem é a encarnação da maldição e da transformação, geralmente associado ao sétimo filho varão. Nas noites de lua cheia, vagueia pelos caminhos, representando o lado selvagem e incontrolável da natureza humana.

 

 

A figura da Bruxa, por vezes chamada “Bruxa Que Voa”, é uma mulher que pratica a feitiçaria, com a capacidade

A Feiticeira que usa o canto ou o encanto para atrair homens (ou raptar crianças) é uma variante poderosa. Ela não se concentra apenas em malefícios,

mas no poder de sedução mágico, que é sempre perigoso para o domínio masculino e a ordem social.

Poder Vocal: O uso do canto liga-a à tradição das Sereias (na mitologia grega) eàideiadequeosomeamúsica têm um poder hipnótico, capaz de levar aspessoasaperderemarazãoeaabandonarem olareafamília.

de deixar o corpo para se transformar em aves noturnas, participando em encontros mágicos.

de deixar o corpo para se transformar em aves noturnas, participando em encontros mágicos.

O “Lugar Longe”: O destino (o “lugar longe”) para onde o homem é levado pode ser interpretado como o mundo do sobrenatural, o domínio da feitiçaria, ou a morte. É um lugar sem retorno ou de onde o homem regressa “louco” ou arruinado.

No campo da narrativa moral, encontramos oDiaboeoastutoPedrode Malas Artes. Enquanto o Diabo representa o mal puro e os pactos tentadores, Pedro de Malas Artes é o anti-herói

popular que consegue, pela esperteza, enganar o Diabo e as autoridades.

Já o Fradinho da Mão Furada é um duende mais brincalhão e doméstico que faz pequenas tropelias nas casas, representando as desordens inexplicáveis do quotidiano.

Os Terrores do Mar

Dado o nosso legado marítimo, o oceano inspirou figuras míticas de grande poder: O Monstrengo é a figura do folclore marítimo que encarna o terror do mar de forma vaga e disforme. É o monstro que aparece em nevoeiros e tempestades, um prenúncio de naufrágio e a explicação popular para a perda dos barcos. O Adamastor é a versão literária e épica desse terror. Eternizado por

Camões n’Os Lusíadas, este gigante é a personificação mitológica do próprio Cabo das Tormentas, amaldiçoando os navegadores portugueses por terem ousado violar o segredo do oceano Austral.

Em resumo, a mitologia portuguesa é uma tapeçaria viva tecida com o misticismo da terra das Mouras, a esperança do mar de D. Sebastião, os terrores do oceano e as figuras singulares que habitam a nossa tradição oral.

Estava a terminar este artigo, quando me lembrei de acrescentar algo mais, que talvez não passe de um sonho ou um pesadelo muito grande.

O Regresso Inesperado: D. Sebastião, o Corvo e a Monarquia de Bolsos

A bruma matinal, companheira eterna

do Sebastianismo, ergueu-se, como sempre, sobre as costas de Portugal. Mas, desta vez, o Rei D. Sebastião, com a pontaria geopolítica de quem esteve ausente por séculos, escolheu a Ilha do Corvo, a mais pequena do arquipélago, para o seu regresso. Afinal, por que reinar um vasto império se podemos reinar sobre uma maravilha geográfica?

Naquela manhã, o nevoeiro ganhou forma na costa. Em vez de um exército, ou de uma nau majestosa, surgiu apenas um homem, de barbas ralas e vestes que pareciam ter saído do século XVI, a cambalear ligeiramente.

O homem dirigiu-se ao único representante do Partido Popular Monárquico (PPM) da ilha, que, sentado num banquinho, lia o jornal e resmungava sobreosimpostoseafaltade grandeza da política moderna. “Meu fiel súbdito!”, bradou o recémchegado. “Eu sou El-Rei D. Sebastião, e vim para restaurar o reino!”

O representante do PPM, que passara a vida a esperar por este momento, mas que só esperava a monarquia em tamanho continental, olhou para o diminuto território.

“Vossa Majestade,” respondeu o político, tentando manter a compostura. “Agradecemos a honra. É verdade que o ponto mais ocidental é nas Flores, mas o Corvo é o reino ideal para um monarca que queira ver todos os seus súbditos sem cansar os olhos.” D. Sebastião sorriu, olhando para os quatro cantos da ilha. “É a glória da concisão! Proclamo o Reino Soberano e Monárquico do Corvo! Aqui, a monarquia será absoluta, mas o rei podevertodaagenteachegareasair. E a primeira medida é nomear o Senhor como meu Primeiro-Ministro com orçamento para um único lápis e um caderno.”

E assim, nasceu a parcela mais pequena e talvez a mais feliz monarquia do mundo. A lenda do Sebastianismo cumpriu-se, não com a grandiosidade épica dos Lusíadas, mas com o sentido de humor irónico de quem sabe que, na política e no folclore português, o mais pequeno detalhe pode conter o maior dos absurdos.

A AUDÁCIA, O SACRIFÍCIO E O LEGADO DAS TROPAS PORTUGUESAS

 A AUDÁCIA, O SACRIFÍCIO E O LEGADO DAS TROPAS PORTUGUESAS

Ao Sabor do Vento

 In Tribuna Portuguesa  October 28, 2025



José Raposo

jmvraposo@gmail.com

 O meu latim resumia se às respostas dos padres quando eu ia à missa, quase todos os domingos. No entanto, tenho curiosidade sobre essa língua milenar, e uma vez que outra deparo com frases muito interessantes que são o lema de grupos, especialmente no que se refere a forças militares. Foi nessa busca que descobri a frase que define os Comandos Portugueses, a mais importante para esta força de elite:

Frase Latina | Tradução | Contexto

Audaces Fortuna Juvat “A Sorte Protege os Audazes” A formulação clássica e oficial do lema, retirada da Eneida de Virgílio. O seu espírito de sacrifício está ainda mais expresso no seu grito de guerra,que não é latino, mas africano: Mama Sumae (ou Mama Sume). Esta frase, adaptada de uma tribo Bantu do sul de Angola, significa “Aqui estamos, prontos para o sacrifício”. Originalmente, o grito era usado em rituais de iniciação de passagem à idade adulta, nos quais o jovem guerreiro tinha de caçar um leão — uma metáfora brutal para o rigor do Curso de Comandos.



ParaTropas Em Angola

A Origem no Ultramar: Três Frentes de Combate

Os Comandos Portugueses nasceram da necessidade urgente de o Exército dispor de unidades de contraguerrilha rápidas e adaptadas aos teatros de operações africanos. A sua criação é um marco da Guerra do Ultramar, com a formação a ser iniciada e replicada nas três frentes de combate:

Angola (O Berço):A formação inicial começou em 1962 em Zemba, no Norte de Angola, sob o Centro de Instrução Especial de Contraguerrilha (CI 21). A designação “Comandos” foi oficializada em 1963–1964 na Quibala. O instrutor inicial, o ex-legionário italiano Cesare Dante Vacchi, teve um papel fundamental na doutrina e na instrução inicial.

Moçambique: A formação foi imediatamente estendida, com o primeiro Curso de Comandos de Moçambique a começar em Fevereiro de 1964 em Namaacha (na região de Lourenço Marques, atual Maputo).



Tropas Portuguesas em Moçambique

Guiné-Bissau: O primeiro Curso de Comandos da Guiné teve início em Julho de 1964 em Brá, na região de Bissau. Posteriormente, o treino foi centralizado: em 1965 no Centro de Instrução de Comandos (CIC) em Luanda, Angola; e a partir de 1966, o Centro de Instrução de Operações Especiais (CIOE) em Lamego, na Metrópole, começou a formar companhias para a Guiné e Moçambique.

Do Ultramar ao Afeganistão: O Legado Ativo

Os Comandos Portugueses não se limitaram à Guerra do Ultramar. O seu espíritodeaudáciaeotreinodeelite mantiveram-nos na linha da frente de missões modernas. Eles tiveram, de facto, um papel nas operações militares no Afeganistão. O Exército Português, através da Brigada de Reação Rápida (BrigRR), participou em várias missões da NATO (Força Internacional de Assistência à Segurança – ISAF – e Missão Resolute Support – RS).



Comandos na Guiné

Unidades de Forças Especiais, como as dos Comandos, foram empenhadas em tarefas de proteção, treino e apoio em ambientes complexos e perigosos. As suas capacidades são precisamente adequadas para atuar onde a sorte tem de proteger os audazes.


Contudo, o esforço em África e a dedicação de Portugal às missões internacionais jamais se limitaram aos Comandos. O lema de “A Sorte Protege os Audazes” é partilhado por todos os militares que serviram a nação, incluindo os Fuzileiros (Forças Especiais da Marinha), a Força Aérea Portuguesa (FAP)—que garantiu o transporte e o apoio aéreo vital—e os milhares de soldados, paraquedistas e marinheiros que, sob o fogo da guerra ou nas águas da NATO, lutaram bravamente por um fim que se revelou inglorioso para a História de Portugal. O sacrifício foi coletivo.



Comandos Portugueses no Afganistão

A VergonhaeoAbandono

Tanto sacrifício, tantas mortes… e eu pergunto: Para quê? A Guerra do Ultramar foi uma autêntica vergonha. Portugal deveria ter pensado muito mais e melhor no processo de desvinculação das províncias ultramarinas. Não houve independência concedida, houve sim um abandono total. Portugal limitou-se a sair, deixando um vazio de poder que levou as ex-colónias a guerras civis imediatas.

Li há dias um artigo sobre os ex-combatentes da Guiné-Bissau que lutaram contra os seus irmãos, pois estavam, nessa altura, debaixo da colonização e eram portugueses, lutando ao lado de Portugal contra uma força que tinha o direito à sua libertação de um regime fascista. Agora, esses mesmos, quer sejam os que cantaram “Adeus Guiné” ou os guineenses que lá ficaram, têm pouco ou nenhum auxílio do Governo Português (cf. DW).



coluna Portuguesa de viaturas Chaimite na Bósnia Hersgovina

Outra frase latina que me vem à memória, e que parece resumir a lição amarga que o país não aprendeu, é:  Si vis pacem, para bellum (Se queres paz, prepara-te para a guerra).

Se a nação não se preparou para o processo de paz e transição, o destino do conflito estava traçado. O sacrifíci das Tropas Portuguesas, audazes no campo de batalha, foi em grande parte perdido por uma nação que falhou na audácia política para gerir o final da guerra.

Honrar a Memória


 


Acima do julgamento político e da vergonha histórica, resta a necessidade de honrar a memória. O sacrifício e a coragem de todas as Tropas Portuguesas, desde a selva de Angola e Guiné até ao deserto do Afeganistão, são factos inegáveis. A sua história, marcada pelo lema latino e pelo grito africano, obriga-nos a recordar que a audácia militar deve ser sempre acompanhada de responsabilidade política, para que o preço pago pelos soldados nunca seja em vão.

Fontes de Apoio e Referências

A inclusão de fontes (sources) é o toque final que confere autoridade e seriedade ao meu artigo, especialmente num tema com tanta carga histórica e emocional.

Lema (Audaces Fortuna Juvat): Virgílio. Eneida, Livro X, linha 284. História e Doutrina Comando: Sítio Oficial do Exército Português (Secção História dos Comandos).

Grito de Guerra (Mama Sumae): Associação de Comandos (Documentação sobre as Tradições e Símbolos).


 


Participação no Afeganistão: NATO e Ministério da Defesa Nacional (Relatórios sobre o empenhamento nas missões ISAF e Resolute Support).

Crítica da Descolonização: DW (Deutsche Welle). Ex-combatentes guineenses com dificuldades de sobrevivência em Portugal. Disponível em: www.dw.com/pt-002/excombatentes guineenses-com-dificuldades de-sobreviv%C3%AAncia-emportugal/ a-17108059.