sexta-feira, 7 de novembro de 2025

 

SE O CAMINHO DA TERRA À LUA…

Ao Sabor do Vento



 

Durante séculos, a lua tem sido uma testemunha silenciosa dos sonhos da humanidade, um farol distante que alimenta a nossa imaginação. Falamos de foguetões e viagens espaciais, do vazio ilimitado para lá do abraço da Terra. No entanto, para mim, a jornada às estrelas começou muito antes do Cabo Canaveral. Começou com o sussurro dos ventos em velas de lona, o ranger de tábuas de

madeiraeacoragemilimitadadaquelesque ousaram navegar o desconhecido. Como um português dos Açores, sempre senti que “Se o caminho da terra à Lua fosse mar o primeiro foguetão teria sido uma caravela Portuguesa”. Esta declaração profunda não é apenas uma fantasia; ela encapsula a própria essência da Era Portuguesa da Descoberta, um espírito que continua a ressoar hoje.

Imagine, por um momento, uma caravela portuguesa, não a navegar as águas azuis do Atlântico, mas a traçar um curso pela escuridão do espaço. As suas velas latinas, perfeitamente projetadas para orçar contra o vento, agora apanham ventos solares, impulsionando a em direção a um horizonte lunar. Esta imagem fantasiosa, nascida de uma profunda compreensão da história e de um espírito irreprimível, liga perfeitamente a distância entre as glórias do passado e as ambições futuras. Ela lembra-nos que a motivação humana fundamental para explorar, para ir além do horizonte, permanece inalterada, quer o destino seja um continente inexplorado ou um distante corpo celeste.

se o caminho da terra à Lua fosse mar, o primeiro foguetão teria sido uma caravela Portuguesa.

Se o caminho da terra à Lua fosse mar, o primeiro foguetão teria sido uma caravela Portuguesa.

A expansão marítima portuguesa, iniciada no início do século XV, foi nada menos que revolucionária. Não se tratava apenas de encontrar

novas rotas comerciais; foi um empreendimento audacioso impulsionado por uma potente mistura de curiosidade científica, necessidade económica e um desejo insaciável de saber o que existia para lá do familiar. Sob a liderança visionária de figuras como o Infante D. Henrique, Portugal desenvolveu sistematicamente o conhecimento, a tecnologia e as técnicas de navegação que iriam transformar o mundo. Reuniram cartógrafos, astrónomos e construtores de navios, unindo a experiência para criar embarcações e métodos capazes de suportar os perigosos e desconhecidos

oceanos.

A própria caravela era uma obra-prima da engenharia naval. Menor e mais ágil que os navios europeus anteriores, com as suas distintas velas latinas, ela podia navegar mais perto do vento, permitindo que os exploradores navegassem contra correntes e ventos predominantes que antes prendiam os marinheiros em águas costeiras. Esta inovação foi tão crucial para a sua época quanto o motor de foguetão é para a nossa. Foi o veículo que transportou homens como Bartolomeu Dias, que primeiro contornou o extremo sul de África em 1488, provando que uma rota marítima

para o Oriente era possível. Transportou Vasco da Gama, que, uma década depois, chegou com sucesso à Índia, abrindo uma ligação comercial marítima direta queremodelouocomércioeapolíticaglobal.

Mas as descobertas portuguesas foram mais do que apenas navios e rotas. Foram sobre a coragem de indivíduos que embarcaram em jornadas sem a certeza de regresso. Enfrentaram tempestades, doenças, encontros hostiseotormentopsicológicododesconhecido. Navegaram durante meses, vendo apenas a expansão infinita de água e céu, guiados por instrumentos

rudimentares e uma crença inabalável na sua missão. As suas jornadas foram repletas de perigos, no entanto, eles continuaram, impulsionados por um imperativo nacional e uma determinação pessoal que beira o heroísmo.

O impacto destas descobertas foi profundo e multifacetado. Globalmente, elas iniciaram a primeira era da globalização, ligando continentes e culturas que antes existiam em isolamento. Levaram a uma troca sem precedentes de bens, ideias, tecnologias e, infelizmente, de doenças e conflitos, alterando para sempre a paisagem demográfica e cultural do planeta.

Para Portugal, trouxeram imensa riqueza, transformando um pequeno reino periférico numa potência marítima dominante. Mas talvez mais duradouro do que o ouro e as especiarias foi o legado de exploração enraizado profundamente na psique nacional. É este legado que dá à minha citação o seu poder. Ela fala de uma herança onde o impossível era apenas o inexplorado. Sugere que o mesmo espírito audacioso que impulsionou caravelas através de vastos e aterradores oceanos está intrinsecamente ligado à ambição de alcançar a lua. Os desafios podem ser diferentes – o vácuo do espaço em vez de correntes traiçoeiras, propulsão avançada em vez de velas latinas – mas a característica humana fundamental permanece: o desejo de aventurar se, de descobrir, de ultrapassar os limites do que é conhecido e alcançável.

Num mundo que muitas vezes parece cada vez mais pequeno e interligado, a ideia da “caravela rumo à lua” serve como uma poderosa lembrança. Ela diz-nos que o espírito de aventura não está confinado a livros de história ou ficção científica. Ele vive dentro de nós, um eco genético daqueles que ousaram navegar para lá do limite do mapa. Encoraja-nos a olhar para novas fronteiras, sejam elas científicas, artísticas

ou pessoais, com a mesma curiosidade destemida que uma vez lançou uma frota de navios de madeira num oceano desconhecido, mudando para sempre o curso da história humana. Ela lembra-nos que o verdadeiro progresso muitas vezes começa com um sonho, uma visão tão grandiosa e improvável como uma caravela a navegar para a lua.

Não tenho dúvida alguma e, repito, que se o caminho da terra à Lua fosse mar, o primeiro foguetão teria sido uma caravela Portuguesa.

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